terça-feira, 30 de junho de 2009

Dia 30 de Junho de 2009

Acompanhei a minha mãe o dia inteiro e as situações desesperantes sucederam-se. Primeiro paramos em Boticas para falar com o médico de família como ela previra. Quando saiu do consultório notei os seus olhos húmidos de lágrimas e explicou-me que ele a encaminhara de imediato para o IPO (instituto Português de Oncologia) onde irá fazer uma biopsia para perceber quão grave é o que tem no peito. Isto porque segundo o médico acha que o caroço é tão grande que não pode ser nada de bom. O mundo caiu-me aos pés. Dentro de mim penso que tinha ainda uma vaga esperança de que o inchaço fosse algo banal, sem importância mas esta constatação por parte do médico de que algo se passa assusta-me profundamente. Na viagem entre Boticas e Chaves choramos os dois. Não aguentei mais como ontem. Afinal de contas comecei a ter consciência do que se estava a passar na minha vida, na vida da minha mãe, de como as coisas mudaram de uma forma tão abrupta. Ela contou-me que já encontrara o caroço há muito tempo mas que não dissera nada por medo. Claro que pensei em insulta-la por ter feito isso mas quando me explicou que apenas o fizera por nossa causa, por causa de toda a família, para não estragar todos os meus sonhos, para não estragar a infância da Rita (a minha irmã de apenas oito anos) e para que ninguém sofresse por ela, não aguentei e chorei, pouco, apesar de ser minha vontade chorar horas a fio.

Em chaves fomos fazer algumas compras… pijamas, materiais de higiene… segundo ela para levar para o hospital se for preciso. Eu acompanhei-a, calado, sem coragem para falar, apenas pensando na situação por que iríamos passar se confirmasse um cancro. Aqueles gestos, o facto de ela estar a comprar tudo aquilo como se soubesse de facto o que lhe ia acontecer deixou-me de rastos, como se toda a esperança que eu sentira no dia anterior me tivesse abandonado finalmente.

Fomos visitar o ortopedista para saber o que se passa com o ombro. Ele disse-lhe que tinha o braço demasiado frágil e que deveria entrar de baixa no emprego de imediato e que talvez as dores que sentira lhe viessem de facto da mama. Terá que fazer uma ressonância magnética para saber o que se passa e a única coisa que peço neste momento é que não seja nada de grava porque já chega a dor que estou a sentir por saber o que se passa no seu peito.

Regressamos a Boticas para uma dura tarefa: a minha mãe contou ao meu pai o que se passa no seu peito. Ela chorou revoltada, ele não. Não é homem de chorar por fora, mas sei que por dentro ficou tão aterrorizado como eu. Afigurou-se-lhe com certeza a possibilidade de perder a mulher de 19 de casamento, tal como a mim se me afigura a cada momento perder a minha mãe, a mulher mais importante de minha vida ao longo destes 18 anos de idade que em retrospectiva me sabem a tão pouco.

Tive de tratar do jantar, da louça, porque ela está proibida de mexer com o braço. Serve para me habituar caso ela vá para o hospital. Mandei uma mensagem á minha tia arlete para que telefonasse e ela assim fez. Falou com a minha mãe que lhe contou o que se passa. Não pude evitar chorar mais uma vez, no meu quarto, ao perceber a inevitabilidade do inferno que vamos viver. Também contei ao meu tio augusto. É algo que temos de fazer, ficar todos ao corrente do que vamos viver. Todos ficaram chocados com a situação, mas nem todos estão informados ainda.

A nossa vida vai mudar. Foi isto que me disse a minha mãe e eu sei que é verdade. O meu sonho de ir para a universidade está em perigo, eu sei, mas não me importo. Neste momento só quero saber das melhoras da minha mãe. Sofro pela minha irmã que, inocente, se passeia pela casa cantando e dançando de pura alegria por ter entrado de féria há pouco tempo. É natural e fico feliz por perceber que a sua inocência não a deixa perceber que algo de muito mau se passa com a sua mãe que ela constantemente diz amar com ternura. Estou a chorar ao escrever isto e era assim que queria ficar para sempre… a chorar para expulsar esta mágoa que sinto, este medo que tenho de perder a minha querida e amada mãe.

Dia 29 de Junho de 2009 -

A minha mãe deu-me hoje a pior notícia que um filho pode ouvir. Descobriu que tem um grande inchaço na mama direita e desconfia que tem cancro. Disse-me tudo isto a chorar à minha frente mas eu não consegui soltar uma lágrima. Talvez fosse do choque, mas naquele momento senti-me mal com a minha frieza. Mis tarde percebi que na verdade não estava bem ciente do que estava a ouvir, por isso não reagi à altura da situação.

A minha mãe tem 44 anos, é uma pessoa encantadora, é a pessoa mais importante da minha vida. Amiga, confidente, poderia usar muitos adjectivos para a caracterizar mas não consigo. O que sinto por ela é forte de mais para ser explicado por palavras. Simplesmente não percebo como poderá ser a minha vida sem ela.

Há cerca de dois meses que se queixa de uma dor incapacitante no braço direito que não lhe permite mexer o braço de forma normal. Apesar disso tem feito uma vida normal e trabalhado de forma afincada tanto em casa como no emprego (é funcionária da Sta. Casa da misericórdia de Boticas e trata das entregas dos almoços aos idosos). Há pouco tempo começou a frequentar médicos para perceber o que se passa e desconfia-se que tenha um quisto no ombro. Amanhã teria uma consulta num especialista dos ossos para saber o que fazer. Mas hoje vem contar-me, sem que nada o fizesse esperar, o que se passa com a sua mama. Gelo… medo… tanto medo é o que sinto neste momento. Amanhã vou com ela ao médico, e não se ao certo o que espero ouvir.

A minha mãe tem cancro na mama

Sou o Rui. Tenho 18 anos e a minha mãe tem cancro na mama. Bem, na verdade ainda não se sabe ao certo mas o médico desconfia que sim e a dor dessa desconfiança já é tão grande como se fosse de facto confirmado.

Decidi criar este blog para escrever aquilo que vou viver ao longo dos proximos meses porque penseo que tenho de extravasar as emoções que estou a sentir de alguma forma.
Não sei se terei alguém a acompanhá-lo mas isso não é o mais importante, desde que daqui a alguns meses eu possa escrever uma mensagem onde diga, enfim: "A minha mãe está curada".